04 dezembro 2009

Vida em código de barras

Por Fábio de Castro


Agência FAPESP – Cientistas de todo o mundo estão participando de um esforço internacional para estabelecer a técnica de DNA barcoding – ou código de barras de DNA – como padrão global para a identificação de espécies biológicas.

Os avanços no desenvolvimento da técnica e os rumos dessa iniciativa internacional foram o foco da discussão do Simpósio Internacional sobre DNA Barcoding do Programa Biota-FAPESP, que teve início nesta quinta-feira (3/12), na sede da Fundação, em São Paulo.



DNA barcoding é um método que utiliza um trecho do DNA de cerca de 650 nucleotídeos como marcador para caracterizar espécies. Trata-se de uma sequência extremamente curta em relação à totalidade do genoma, que nos humanos, por exemplo, tem 3 bilhões de pares de bases.



A ordem dos nucleotídeos nesse trecho de DNA, extraído de uma sequência de pequenos fragmentos previamente padronizados de genes, é semelhante entre os indivíduos, mas divergente em relação às diferentes espécies, possibilitando a identificação.



O método, que tende a ser rápido e barato, pode identificar uma espécie a partir de uma pequena amostra de tecido. Por isso, tem aplicações potenciais que vão desde o combate à biopirataria até o controle de pragas e a investigação forense.



De acordo com uma das coordenadoras do simpósio, Mariana Cabral de Oliveira, do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP), o evento marca a entrada efetiva da comunidade científica brasileira na iniciativa global para o desenvolvimento da nova ferramenta.



“Há um esforço internacional sendo feito para a aplicação dessa ferramenta em todas as espécies. Há pesquisadores brasileiros colaborando com o grupo do Canadá que está encabeçando o projeto mundial de DNA barcoding, mas essa participação ainda é individualizada. A ideia é que o Brasil entre nisso de forma mais ampla e efetiva”, disse à Agência FAPESP.



Segundo Mariana, que faz parte da coordenação do Biota-FAPESP, a comunidade internacional que está trabalhando com o DNA barcoding manifestou interesse na participação do Brasil nos projetos. “O Brasil é considerado central nesse processo por ser um país megadiverso. Sem a nossa participação, haveria uma grande lacuna no estudo dos seres vivos”, afirmou.



O objetivo final do projeto internacional é criar uma biblioteca de códigos de barra de todas as espécies de seres vivos. “Neste momento estamos focando nas espécies eucarióticas – aquelas cujas células têm núcleos –, definindo os marcadores associados a cada uma delas”, explicou.



Participam do simpósio cientistas envolvidos com diferentes grupos de organismos, como plantas, insetos, aves e peixes. O objetivo é mostrar como a nova ferramenta pode ser usada em cada um dos grupos e quais são as dificuldades e limites para aplicação.



“Estamos discutindo as especificidades, as possíveis soluções para os obstáculos e o potencial de sucesso do DNA barcoding para cada grupo. Trouxemos especialistas para mostrar o que vem sendo desenvolvido em cada um dos grupos, além de outros que apresentarão um panorama mais amplo sobre a técnica”, explicou.



Os cientistas brasileiros também participaram, segundo Mariana, mostrando o que está sendo feito no país na área. “A ideia é indicar como essas pessoas podem se associar, montando um esforço regional que possa ser integrado à iniciativa internacional”, disse.



O Biota-FAPESP, segundo ela, reconheceu, em reunião realizada em junho, que o DNA barcoding é uma ferramenta fundamental para estudar a biodiversidade. “A comunidade que participa do Biota está tentando organizar isso de forma mais efetiva. Estamos discutindo se isso deverá ser feito na forma de um edital, ou de um envolvimento mais amplo, em nível federal”, contou.



500 mil espécies em cinco anos

A programação do simpósio foi aberta com palestra de Paul Hebert, da Universidade de Guelph, no Canadá. Herbert, que propôs, em 2003, a técnica do DNA barcoding, é diretor científico do Projeto Internacional do Código de Barras da Vida (iBOL, na sigla em inglês), que será lançado em julho de 2010, com sede no Canadá.

Segundo ele, a nova técnica terá impacto sem precedentes no conhecimento sobre a biodiversidade. “Mesmo com 250 anos de grandes esforços científicos, muitas espécies ainda permanecem desconhecidas. Essas barreiras à análise da biodiversidade vão ser quebradas com o DNA barcoding”, disse.

Pesquisadores de 25 países estão participando da iniciativa, que deverá compilar, em códigos de barras de DNA, cerca de 5 milhões de amostras de 500 mil espécies nos próximos cinco anos.

“Desde 2005, estamos compilando cerca de meio milhão de amostras a cada dois anos. Mas o trabalho está apenas começando. No futuro esperamos ter sistemas automatizados que apoiem as identificações de grandes numeros de espécies”, disse.

De acordo com Herbert, o DNA barcoding apresenta várias vantagens em relação aos métodos morfológicos tradicionais de taxonomia. “O processo de identificação pode ser todo automatizado e podemos aplicá-lo em qualquer momento do ciclo de vida do organismo, ou a um fragmento dele”, afirmou.

Além de melhorar a capacidade de monitorar e entender a biodiversidade, com diversas aplicações, a técnica, segundo ele, trará grandes benefícios científicos. “Vamos começar a entrar em problemas evolucionários e ecológicos interessantes”, disse.

John Kress, do Instituto Smithsonian, dos Estados Unidos, apresentou estudos sobre um dos principais problemas da nova técnica: a aplicação do DNA barcoding à identificação de plantas. Segundo ele, o gene COX1, de onde é extraído o trecho de DNA utilizado como marcador de maior sucesso até agora, é demasiadamente uniforme nas plantas, o que impede a identificação das espécies.

“Nas plantas, esse gene não tem um nível de variação suficiente para ser utilizado como marcador. Então precisamos começar um processo de prospecção de outras regiões dos genes para desenvolver marcadores específicos. São muitas opções. Precisaremos mobilizar a comunidade de botânicos em torno de um consenso”, disse.

Apesar da dificuldade, seu laboratório no Instituto Smithsonian está empenhado em encontrar soluções. “Precisamos de uma sequência curta – entre 300 e 800 nucleotídeos, que permita o uso em amostras degradadas e que nos forneça uma alta qualidade das sequências, para podermos trabalhar de forma automatizada”, disse.

Enquanto nos marcadores atuais utiliza-se um trecho de DNA extraído da mitocôndria, no caso das plantas o principal candidato é o DNA do cloroplasto. De acordo com Kress, esse tem sido o foco atual das pesquisas.

“Fizemos estudos utilizando a combinação de marcadores de três diferentes genes diferentes aplicados a amostras de 300 espécies de plantas em uma área de 50 hectares na ilha de Barro Colorado, no Panamá. A partir dessas amostras conseguimos identificar as espécies com correção em mais de 98% dos casos.

Mais informações sobre o Biota-FAPESP International Symposium on DNA Barcoding, que termina nesta sexta-feira (4/12): www.fapesp.br/materia/5445.

Fonte: Agência Fapesp

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